Bioquímica do Alzheimer

“Como é terrível o dom do conhecimento, quando não serve a quem o tem!”

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

A Desorientação Topográfica na Doença de Alzheimer

   A desorientação topográfica (DT) é um sintoma recorrente da doença de Alzheimer e é definida como dificuldade para seguir rotas familiares, reconhecer lugares já conhecidos, utilizar mapas para localização, descrever verbalmente um caminho ou reconhecer pontos turísticos. É um sintoma que pode ser o primeiro a aparecer ou se desenvolver enquanto a doença progride.
 

    A orientação topográfica em ratos é acionada por células piramidais do hipocampo que possuem um padrão de potencial de ação para cada local em que o animal se encontra, e por isso são chamadas de "células de localização". O artigo escrito pelos neurologistas Carla Cristina Guariglia e Ricardo Nitrini (ambos da Universidade de São Paulo) "Topographical disorientation in Alzheimer's disease", publicado em 2009, espera estudar esse sintoma comum da doença de Alzheimer que não tem recebido tanta atenção dos pesquisadores como os outros.

Célula piramidal do hipocampo (seta)


 


    O estudo utilizou trinta pacientes com provável Alzheimer ou leve/moderada demência, todos habitantes de São Paulo e com oito anos de estudo para que a instrução não fosse fator determinante dos resultados. Em contraste com os doentes, foram utilizados trinta pessoas saudáveis para serem usados como controle.  

   O estudo utilizou-se de vários testes sobre orientação topográfica em geral para analisar o estado dos pacientes e dos controles, com testes específicos para cada habilidade de localização. Por exemplo: a sua orientação topográfica foi testada com 3 perguntas sobre localização e habilidade para caminhar em locais perto de casa, tendo a potuação variando de 0 a 3 (com 3 indicando maior desorientação), e o reconhecimento de pontos turísticos foi testado mostrando 22 fotos de pontos turísticos de todo o Brasil, recebendo a pessoa 1 ponto para cada acerto. O estabelecimento de rotas foi testado pedindo aos pacientes e controles que descrevesse o caminho de sua casa até a mercearia mais próxima, podendo ser pontuado com 0; 0,5 e 1; sendo 1 a pontuação de melhor performance.
 

   Entre todos os testes realizados, que totalizaram 14, os pacientes com demência apresentaram diferenças significativas nos resultados em 11 dos testes quando comparados com os controles. Os pacientes com leve e moderada demência não apresentaram diferenças significativas de resultados entre eles com excessão dos teste de reconhecimento de pontos turísticos e descrição de rota. Entre pacientes com leve demência e os controles nota-se diferenças significativas de resultados em 7 dos 14 estudos.
 

   Os resultados mostraram que até mesmo pacientes com leve demência apresentam desorientação topográfica, apesar de ainda possuirem habilidades cognitivas ausentes nos pacientes com demência moderada, resultados estes também obtidos similarmente em outros estudos sobre o assunto. Isso mostra que alguns sintomas da desorientação topográfica já aparecem no início da doença, sendo um dos primeiros sintomas que podem ser identificados. Por exemplo, a desorientação alocêntrica, que é a incapacidade de determinar a posição de objetos relativos a outros, é um sintoma tanto comum em pacientes com leve demência como em pacientes com moderada, o que prova que é um sintoma inicial, assim como a desorientação egocêntrica que se refere à posição do peciente com relação a outros objetos. Já a descrição de rotas foi um sintoma mais notado em pacientes com demência moderada, com Alzheimer mais avançado.
 

   Além das células piramidais do hipocampo envolvidas, podem ser afetadas células do córtex retrosplênico, causando problemas na orientação, e células do córtex parietal, causando problemas na movimentação óptica (sensação de movimento de objetos e superfícies). Apesar do estudo possuir limitações, já que a DT foi identificada nos pacientes apenas com um questionário e não com um teste ambiental, foi possível detectar a diferença de sintomas e da sua severidade nos pacientes com leve e moderada demência e nos controles.


Escrito por: Patrícia Monteiro

Fontes Bibliográficas:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004-282X2009000600001&lang=pt
http://minerva.ufpel.edu.br/~mgrheing/cd_histologia/geral/G5_400x_piramidal_OK.jpg

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Os esteroides e a Doença de Alzheimer


          Os estrogênios são esteroides sexuais que apresentam uma atuação reparadora sobre neurônios que apresentam lesão, o estradiol, por exemplo, pode aumentar a sobrevida de células nervosas quando adicionado in vitro ao meio de cultura delas. Diversos estudos indicam que os estrogênios atuam de forma a ativar ou inibir enzimas que agem sobre a síntese de neurotransmissores (por exemplo serotonina e acetilcolina). Pesquisas que utilizam animais ooforectomizados (sem um ovário ou sem os dois ovários) têm reconhecido que o estrogênio induz mudanças no metabolismo da serotonina em áreas do cérebro que envolvem a cognição.

          No Alzheimer, os neurônios colinérgicos são afetados e sofrem alterações degenerativas, sendo que esses neurônios são necessários para o aprendizado e a memória. Nessas áreas do sistema nervoso central há a diminuição da atividade da enzima acetilcolinatransferase (ChAT), que atua juntamente com a acetil-coenzimaA na síntese de acetilcolina (que é degradada pela acetilcolinesterase). Experimentos têm mostrado que os estrogênios ativam a acetilcolinatransferase (por um mecanismo ainda não identificado), propiciando a síntese de acetilcolina e impossibilitando a atuação da acetilcolinesterase. É importante perceber que o aumento da atuação da ChAT é diferente de acordo com o sexo, ele foi observado mais em ratas ooforectomizadas.

          O estradiol se relaciona com esses neurotransmissores ainda por meio da interferência nos receptores, por meio de catecolestrogênios. Estudos com imunocitoquímica indicaram que a atuação dos receptores de estrogênio Alfa e Beta no hipotálamo pode estar diferente no Alzheimer.

          Por outro lado, as progesteronas atuam no sistema nervoso central de uma forma contrária aos efeitos do estrogênio. Elas agem aumentado a atividade da enzima monoaminaoxidase (MAO), que atua metabolizando alguns neurotransmissores, entre eles a serotonina, causando dessa forma um efeito depressivo (para mais informações vide o post “Outros medicamentos antidepressivos usados no tratamento de depressão para pacientes com Alzheimer”). Em estudos com animais, encontrou-se receptores para progesterona em áreas relacionadas ao aprendizado, emoções, regulação endócrina, em que a progesterona atua de forma depressora dessas funções.

          Há indícios de que os esteróides sexuais induzem alterações na cognição, sendo que isso varia entre os sexos feminino e masculino. Estudos demonstram que os esteroides sexuais estão relacionados a regiões do cérebro afetadas no mal de Alzheimer, por meio da interferência em processos de envelhecimento e desenvolvimento. Tem sido indicado que a terapia estrogênica ou estro-progestativa  pode resguardar contra a piora dos processos cognitivos, além disso os hormônios relacionados a essas terapias aumentam o fluxo sanguíneo em áreas do cérebro que estão ligadas à memória.
          Embora tenham sido realizados diversos estudos, existem ainda controvérsias em relação aos efeitos dos esteroides sexuais sobre os neurotransmissores e neurônios. É importante ressaltar, então, que ainda não está bem determinada a atuação deles no tratamento clínico de doenças neuropsiquiátricas.


Escrito por: Lorena Castelo Rodrigues
Fontes de Pesquisa: 

http://www.clinicafares.com.br/dicas-de-saude/Soja-80/Saiba-sobre-o-efeito-de-isoflavona-na-doenca-de-Alzheimer-30242.html

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Antioxidantes, vitaminas e anti-inflamatórios não hormonais: as novas promessas.


           Na busca de novas técnicas para a prevenção da doença de Alzheimer, foi testada uma possível relação entre a hiperfosforilação da proteína tau, a atuação da apolipoproteína E4 e a deposição de placas de beta-amiloide, todas relacionadas como prováveis causas da doença, com o estresse oxidativo. Dessa forma, alguns estudos tentaram descobrir se é possível aumentar o grau de prevenção da doença de Alzheimer com a ingestão de antioxidantes.
            No momento ainda é desconhecida a relação entre esses dois fatos, se ela existe de fato, ou qual então seria a causa e qual a consequência. Isso se reflete no fato de que vários grupos que estudam o Alzheimer discordam dessa relação, enquanto vários outros concordam. Da mesma forma, há estudos que comprovam que uma ingestão maior de antioxidantes aumenta o grau de prevenção do Alzheimer, há estudos que não colocam nenhuma relação entre ambos, e há estudos em que os antioxidantes conseguiram combater outros tipos de demências, mas não o Alzheimer especificamente.
            A maior parte dos estudos com relação aos antioxidantes faz testes com a vitamina C e a vitamina E. Ambos são antioxidantes naturais, sendo o primeiro hidrossolúvel e o segundo lipossolúvel. São compostos que necessitam de uma ingestão diária regular pequena, ambas com menos de 100mg.
            A vitamina E, por ser lipossolúvel, se apresenta como o maior antioxidante de membrana, impedindo a peroxidação lipídica (processo pelo qual ácidos graxos poli-insaturados formam radicais livres) de avançar. Outros estudos indicam que ela tem outros métodos de proteção da membrana celular do neurônio, evitando o rápido avanço da doença causado pelas placas de beta-amiloide. Entretanto, ao prevenir a peroxidação lipídica, a vitamina E dá origem ao radical tocoferoxil. Neste ponto, ocorre a atuação da vitamina C, que se oxida, reduzindo assim o tocoferoxil, e assim restituindo a estrutura da vitamina E.
            Os estudos apresentados com essas vitaminas, até os dias atuais, mostram uma utilização de suplementos, os quais usam doses de 500mg-1000mg dessas vitaminas. De fato, na maioria deles, houve um risco menor de se contrair Alzheimer pelo usuário do suplemento, entretanto essas doses são muitos maiores do que o recomendado diariamente para o ser humano, o que pode interferir na homeostase celular (equilíbrio entre radicais livres e antioxidantes), o que pode acarretar em diversas disfunções.
            



           Recentemente, devido à descoberta de inflamações pré e pós desenvolvimento da doença de Alzheimer, foi começado o teste de fármacos anti-inflamatórios não esteroides para a prevenção da doença. Eles estão ligados, principalmente, com a inibição da enzima COX. 
            A enzima COX, em sua conformação COX1 ou em sua conformação COX2, tem função de metabolizar o ácido. Em situações normais, a COX1 é mais normal em tecidos do que a COX2,a qual é relacionada com o Alzheimer em concentrações mais altas. Os principais fármacos estão ligados a inibição da COX2, dentre eles o paracetamol e o ibuprofeno (representados acima, a embalagem comercial à esquerda e a molécula do fármaco respectivo à direita) são os mais conhecidos.
            Entretanto, não se sabe ao certo se a prevenção e o tratamento do alzhemier feito com drogas anti-inflamatórias não esteroides tem, realmente, relação com a inibição da COX. Não se sabe ao certo se é pela sua cascata anti-inflamatória, se é pela inibição da COX2, ou se é por algum outro tipo de fator.
            Portanto, o consumo desses medicamentos deve ser acompanhado de receita médica, uma vez que podem causar vários tipos de efeitos colaterais, uma vez que a mesma droga,muitas vezes, consegue inibir tanto a COX1 como a COX2, e elas estão presentes em grande parte dos tecidos do corpo.
            Com isto, se encerram os tópicos de prevenção do Alzheimer.

           Escrito por: José Alberto Souza Abdon
           
           Fontes de pesquisa: 





Doença de Alzheimer: Apolipoproteína E


Lipoproteínas são elementos precípuos no transporte e metabolização de lipídios no organismo. São caracterizadas de acordo com sua estrutura, seus aspectos bioquímicos e propriedades fisiológicas. As apoliporoteínas correspondem à fração protéica desses compostos de composição mista, conferindo-lhes características estruturais de solubilidade e estabilidade no meio aquoso, ao mesmo tempo em que lhes permitem atuar como ligantes para receptores que medeiam o transporte e distribuição de lipídios através das membranas e efetores alostéricos de enzimas metabolizadoras de lipídios.

Dentre as principais apoliproteínas encontradas no cérebro está a ApoE( apolipoproteína E). Trata-se de uma glicoproteína contendo 317 aminoácidos que, uma vez sintetizada nos hepatócitos e nos astrócitos e células da micróglia do Sistema Nervoso Central, é exportada ao plasma ou ao líquido cerebrospinal, onde passa a circular conjugada como componente principalmente de lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL) e de lipoproteínas de alta densidade (HDL), por sua vez, envolvidas no trânsito de triacilgliceróis e colesterol pelos diferentes tecidos. A ApoE exerce um papel essencial no catabolismo de componentes ricos em triacilgliceróis ( ácidos graxos esterificados ou triglicerídeos) no corpo humano. Deficiências dessa proteína implicam inúmeras doenças envolvidas com a elevação no nível de colesterol e triacilgliceróis na circulação, em virtude do não reconhecimento dessas moléculas pelos receptores de membrana dos quilomícrons (lipoproteína formada no intestino delgado e rica em triacilgliceróis oriundos da dieta) e das moléculas de VLDL presentes no fígado. Devido ao aumento na concentração dessas substâncias no sangue, é que a ApoE é bastante estudada em doenças cardiovasculares, apresentando uma ligação direta com estenoses e infartos. A ApoE constitui de 10% a20% das moléculas de VLDL e de 1% a 2% das de HDL. Visualize abaixo a conformação tridimensional da ApoE4. Em seguida, observe a forma como triglicerídeos, colesterol e proteínas se agregam para compor a estrutura de uma lipoproteína (VLDL, HDL,LDL,etc).







Até o momento, credita-se a DA de início precoce a mutações em genes que codificam para a proteína precursora da Beta-amilóide (APP: b-amyloid precursor protein-21q21.3), presenilina 1 ( PSEN1: presenilin 1- 14q24.3) e presenilina 2 ( PSEN2: presenilin 2 - 1q31­q42). Mutações nos genes indicados acima respondem por aproximadamente 40% dos casos de DA com início precoce ( revisão em Tanzi e Bertram, 2001). Entretanto, a DA de início precoce foge ao padrão de origem dos primeiros sintomas de DA, em que aproximadamente 95% deles surgem tardiamente. O espectro de mutações gênicas para os casos de DA de início tardio é mais variado. Contudo, somente o alelo ε4 do gene ApoE (19q13.2) aponta para uma associação consistente com a DA em vários estudos independentes (revisão em Laws et al., 2003).
Na posição 13.2 do braço longo (q) do cromossomo 19, localiza-se o gene ApoE. Este apresenta quatro éxons ( 1156 nucleotídeos dos 6740 nucleotídeos do transcrito primário, com mRNA rico em guanina e citosina) e três alelos principais cognominados de ApoE ε2, ApoE  ε3 e ApoE ε4, que codificam às isoformas de ApoE designadas, respectivamente, por ApoE2, E3 e E4 e que se distinguem entre si, no éxon 4 do códon, pelo conteúdo de arginina na posição 158 e de cisteína na posição 112. Por permutação desses três alelos principais, originam-se seis possíveis genótipos: ε2/ε2, ε2 / ε3, ε2/ε4, ε3/ ε3, ε3/ε4 ou ε4/ε4. Abaixo, demonstração do loci gênico da ApoE.


A ApoE3 é identificada por uma arginina na posição 158 e uma cisteína na 112 e apresenta uma frequência de 74% a 78% em populações caucasianas.
NA ApoE4, com frequência de 14% a 15% nesse mesmo grupo étnico, consta o aminoácido arginina em ambas as posições ( 112 e 158 do códon). Já ApoE2 apresenta cisteína nas duas posições do códon e prevalência de apenas 8% a 12% em caucasianos.
 A isoforma ApoE2 parece ser um fator de proteção à DA, enquanto a ApoE4 é tida como um fator de risco. Quando da presença de apenas um alelo ε4 existe um risco de 3 a 4 vezes maior de desenvolver a DA em comparação à população geral. Pior prognóstico de risco é dado aos indivíduos com dois alelos ε4. Nestes o risco aumenta para 8 ou até 14 vezes mais em relação à população geral.
Dois modelos tentam explicar o papel da ApoE no acúmulo de proteínas Beta-amilóide: no primeiro, a forma solúvel dessa proteína interagiria com a ApoE da lipoproteína e seguiria para a endocitose mediada por um receptor. Posteriormente, as lipoproteínas são digeridas por enzimas lisossômicas, o que libera o colesterol à célula. Nessa organela, uma fração do complexo ApoE-Proteína Beta-amilóide  é degradada. Todavia, o restante da ApoE que permanece associada à Beta-amilóide promove a agregação desta em fibrilas amilóides, as quais serão secretadas de volta ao meio extra-celular. Dentre as isoformas de ApoE, a ApoE4 é a que apresenta afinidade maior pela Proteína Beta-amilóide. Portanto, pode ser esperada uma aceleração no processo de formação de placas senis nos casos de DA. No segundo modelo, a ApoE4 não só favorece a entrada de proteína Beta-amilóide na célula nervosa, mas também enseja a síntese desse polipeptídeo  através da liberação de colesterol no interior da célula. Isso porque após a endocitose mediada por receptor e a digestão enzimática das lipoproteínas, o colesterol é liberado para as membranas celulares. Maior quantidade de colesterol é encontrada nas lipoproteínas com ApoE4, e o aumento do conteúdo desse esterol nas membranas celulares induz um aumento na síntese de proteína Beta-amilóide, resultando em uma liberação maior desta para o meio extracelular (revisão em Puglielli et al., 2003).
A presença de dois alelos ε4 não é uma condição necessária, tampouco suficiente, para o aparecimento da DA. Nos diferentes grupos étnicos, a presença do alelo  ε4 da ApoE varia significativamente. O risco parece ser maior em caucasianos e africanos, porém menor entre africanos e hispânicos. Existem muitos indivíduos que, embora apresentem a isoforma ApoE4, nunca chegam a desenvolver DA. Ademais, estimativas  indicam que ao menos 40% dos pacientes com DA esporádica(não familiar) não apresentam aquela isoforma e, sabe-se que, mesmo indivíduos com a isoforma E2, não estão necessariamente imunes à DA. Por essas razões é que a identificação desses marcadores mediante realização de testes não é indicada, pois, inexistindo uma prevenção comprovada à DA, poderiam ser incitados sentimentos de angústia e apreensão aos portadores.



Retirada da fonte bibliográfica 1.

Bibliografia:
Autor: Pedro Lôbo de Aquino Moura e Silva

terça-feira, 11 de setembro de 2012

A relação entre o tratamento de diabetes tipo II e Alzheimer

 A sinalização de insulina defeituosa no cérebro foi descoberta como um dos fatores que contribuem para o déficit cognitivo dos pacientes da Doença de Alzheimer, e a partir de estudos feitos nessa área descobriu-se uma ligação da DA com diabetes que pode abrir portas para novos tratamentos do Alzheimer. O IRS-1pSer, receptor de insulina citado no post "Insulina como forma inovadora de tratamento da doença de Alzheimer" com serina fosforilada, é um composto presente em ambas as doenças em grandes quantidades, assim como o composto JNK-ativo (composto atuante na neurodegeneração). Os ADDLs, também explicados no último post, são responsáveis pela fosforilação do IR em resíduos de serina e da ativação do composto JNK, contribuindo para o não pareamento axonal e para a sinalização defeituosa da insulina no sistema nervoso central. Os problemas sinápticos causados pela injeção de ADDLs em ratos foram prevenidos pela exposição dos animais à exenatide, substância utilizada no tratamento da diabetes tipo II, que diminuiu as concentrações de IRS-1pSer e JNK-ativo no cérebro.    
             
IRS-1pSer em neurônios do hipocampo de paciente de Alzheimer de 68 anos (B) comparado com IRS-1pSer em paciente saudável de 73 anos (A)





IRS-1pSer em neurônio do hipocampo normal (D) comparado ao IRS-1pSer em neurônio do hipocampo exposto a ADDLs

  Estudos foram realizados para se descobrir a relação do JNK-ativo com a fosforilação do IR em diabetes e em resistência à insulina causada por obesidade. Os ADDLs falharam em produzir IRS-1pSer em neurônios do hipocampo que não apresentavam JNK, indicando seu papel importante na resistência à insulina, e o mesmo aconteceu quando foi utilizado um inibidor farmacológico do JNK. Além disso foram detectadas altas taxas de JNK em neurônios do hipocampo de pacientes de Alzheimer.


Concentrações de JNK em neurônios de hipocampo normal (A) comparado com as concentrações de JNK nos neurônios do hipocampo de pacientes de Alzheimer

  A resistência à insulina em tecidos periféricos é característica marcante da diabete tipo II e evidências mostram que o mesmo ocorre no cérebro do paciente de Alzheimer, contribuindo com os sintomas da demência, já que a sinalização correta da insulina no sistema nervoso central é importantíssima para o aprendizado e a memória. A nova droga exenatide atua ativando vias análogas às da sinalização da insulina através da estimulação de receptores glucagon-like peptide 1 (GLP1), revertendo assim a resistência à insulina no hipocampo. O GLP-1 aumenta a sensibilidade das células à insulina e também sua produção, e diminui a concentração de glucagon na corrente sanguínea. A exenatide não consegue bloquear a ligação dos ADDLs aos neurônios, mas consegue interromper sua ação de fosforilar o IR, através da ativação do GLP1. Como a ação da droga não declinaria ao passar do tempo, o que ocorre normalmente com a sinalização da insulina, a exenatide talvez seja melhor que um excesso de insulina para a diminuição dos impactos causados pelos ADDLs nos neurônios.


Neurônio do hipocampo com pouco IRS-1pSer causado pela supressão do JNK-ativo

  Ratos tratados por 3 semanas com exenatide obtiveram menores taxas de IRS-1pSer e JNK-ativo no cérebro e apresentaram melhor desempenho no labirinto aquático de Morris (explicado no post "Amenização dos sintomas da DA com exercícios cognitivos"), assim como maior retenção de memória. O fármaco utilizado no tratamento da diabete tipo II parece ser promissor também no tratamento da "diabete" que ocorre no cérebro devido a resistência à insulina dos neurônios desse órgão durante a Doença de Alzheimer.




Escrito por: Patrícia Monteiro

Fontes bibliográficas:
http://www.jci.org/articles/view/57256
http://en.wikipedia.org/wiki/C-Jun_N-terminal_kinases
http://en.wikipedia.org/wiki/Glucagon-like_peptide-1

domingo, 9 de setembro de 2012

Insulina como forma inovadora de tratamento da doença de Alzheimer


          Os ADDLs (oligômeros do peptídeo Beta-Amilóide) foram descobertos como sendo potentes neurotoxinas para o sistema nervoso central. Eles atuam como ligantes patogênicos, que se unem com especificidade a determinadas sinapses. Entre os efeitos deletérios dos ADDLs estão a perda de sinapses, a indução do estresse oxidativo, a indução da hiperfosforilação da proteína tau (para mais informações vide o post "Alzheimer e proteína Tau-parte 2") e a redistribuição na membrana plasmática dos receptores de insulina.

          Foi feita uma hipótese de que deve haver algum mecanismo de defesa da célula para proteger as sinapses da toxicidade do ADDL. Em indivíduos normais, esse mecanismo de defesa contribuiria para a manutenção de suas funções cognitivas, em pessoas com defeitos nesse mecanismo, poderiam ser feitos medicamentos que tenham-no  como alvo, por exemplo em pessoas que apresentam doença de Alzheimer nos estágios iniciais. Há a possibilidade de que um desses mecanismos de proteção seja promovido pela sinalização da insulina no sistema nervoso central. Recentemente, foi mostrado que o medicamento rosiglitazona(medicamento de sensibilização à insulina) e a insulina melhoram a cognição em pacientes com Doença de Alzheimer em estágios iniciais e em ratos com Alzheimer. Contribuindo para a associação de Doença de Alzheimer com a insulina, Pacientes que apresentam a Diabetes tipo 2 (que está relacionada à resistência à insulina) apresentam um risco maior de apresentar Doença de Alzheimer.

          Um estudo feito para testar a hipótese da proteção fisiológica das sinapses da toxicidade do ADDLs pela sinalização da insulina mostrou que a insulina previne a neurotoxicidade. A diminuição da ligação é causada pela regulação negativa dos sítios de ligação do ADDL por meio de um mecanismo que necessita da atividade da tirosina quinase do receptor de insulina (IR). Esse é o mecanismo que está por trás da resistência à insulina do sistema nervoso central na Doença de Alzheimer. A atuação da insulina e do ADDLs acabam regulando a quantidade de sítios de ligação de cada um, o que gera um equilíbrio competitivo entre a sobrevivência e a morte da sinapse. A sinalização da insulina no cérebro diminui com o aumento da idade, a regulação desse equilíbrio da sinapse mostra-se, então,como um fator de risco para a Doença de Alzheimer, que pode ser bem adaptado para a intervenção. Tendo a intenção de levar o balanço do equilíbrio em favor da sobrevivência da sinapse, novos medicamentos relacionados ao aumento da sinalização da insulina no sistema nervoso central irão gerar uma nova classe de medicamentos para a Doença de Alzheimer.


          Por meio da imunocitoquímica, percebeu-se que  ADDLs instigavam a eliminação de receptores de insulina de dendritos de células nervosas, além disso notou-se um aumento da imunorreatividade no corpo celular, indicando uma redistribuição dos receptores de insulina. Chama a atenção o fato de os receptores de insulina saírem somente da superfície da membrana, dessa forma, a concentração dos IRs quase não é alterada no citoplasma do neurônio. Outros resultados indicaram que ADDLs têm uma atuação seletiva ao acelerar a endocitose de determinadas proteínas de superfície como, por exemplo, os IRs. 

          
          Além da relação com IRs, os oligômeros do peptídeo Beta-Amilóide também causam a internalização dos receptores de glutamato NMDA (para mais informações vide o post “Memantina e sua estratégia no tratamento da Doença de Alzheimer”). Essa internalização é mediada pela caseína-cinase 2 (CK2) e pela Ca2+/ Quinase dependete de calmodulina II (CaMKII). Foi testada a hipótese de que a internalização do NMDA e do IR por meio da indução do ADDL possuíam mecanismos em comum que se relacionassem com CK2 e CaMKII. Compatível com essa hipótese foi descoberto que um inibidor da CK2, DMAT, bloqueou completamente a indução causada pelo ADDL da perda do IR e do NMDA dos dendritos dos neurônios do hipocampo. Descobriu-se também que um inibidor do CaMKII, KN93, promove uma proteção parcial contra a indução feita pelo ADDL da perda dos dois receptores.

          Estudos recentes têm mostrado que a administração intranasal de insulina melhora a memória em pacientes com Alzheimer (e também em indivíduos sem demência!).  A insulina protege os receptores de insulina da superfície nos neurônios que estão sujeitos aos ADDLs, dependendo da dose ela pode prevenir ou até mesmo bloquear completamente a perda de IR induzida pelos ADDLs.

       
O neurônio da esquerda apresenta sinapses reduzidas, enquanto o neurônio da direita  tem suas sinapses conservadas.  Os dois neurônios foram expostos a oligômeros tóxicos, porém com a insulina, o neurônio da direita se manteve saudável. A cor vermelha indica os oligômeros tóxicos.


        Escrito por: Lorena Castelo Rodrigues
Fontes de pesquisa:
http://www.pnas.org/content/106/6/1971.full.pdf+html
http://www.sigma-foco.scire.coppe.ufrj.br/UFRJ/SIGMA/jornadaIC/publicacao_foco/trabalhos/consulta/relatorio.stm?app=JIC_PUBLICACAO_TRABALHO&ano=2009&codigo=2699&buscas_cruzadas=ON
http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,insulina-pode-ajudar-a-combater-mal-de-alzheimer,317179,0.htm
http://www.braincampaign.org/Common/Docs/Files/2780/ptchap10.pdf

terça-feira, 4 de setembro de 2012


Uma querela: Alzheimer e Alumínio...



Um breve histórico
A hipótese na qual a etiologia da DA está imputada ao metal alumínio foi sugerida em meados da década de 1960. Em 1965, foi reportada degeneração neurofibrilar semelhante a da DA quando da inoculação intracerebral de fosfato de alumínio em coelhos (Klatzo e Terry, 1965). Em 1973, foi divulgada, por meio de citação, que concentrações elevadas de alumínio eram encontradas nos cérebros de todos os pacientes com DA, então acompanhados (Crapper, 1973). Contemporânea a essa citação e pouco após a introdução da terapia por diálise em pacientes com insuficiência renal, Alfrey e colaboradores relataram a encefalopatia iatrogênica causada por diálise. Já na década de 1980, surgiram tentativas de relacionar os níveis de alumínio na água potável com a DA. A esta época, dois estudos paralelos encontraram indícios de que a mortalidade por demência foi superior em regiões da Noruega onde a água potável continha altas concentrações de alumínio (Flaten e Vogt, 1986). Estudos epidemiológicos posteriores, publicados na Grã-Bretanha e em diversos países, ratificaram tal associação.
Ademais, existem muitos experimentos com animais e com células isoladas mostrando que o alumínio apresenta efeitos tóxicos no sistema nervoso, muito embora, em quase todos os casos, a dosagem de alumínio administrada foi muito superior quando comparada ao nível desse metal naturalmente existente nos tecidos (Gilteman, 1988).
Fontes de Alumínio
As principais fontes de alumínio na dieta humana incluem chás, cervejas, produtos assados, água potável, pastas de dente, antiácidos a base de alumínio (Hidróxido de alumínio, principalmente.), utensílios de cozinha e algumas bebidas enlatadas (Rao e Rao 1995). O alumínio assimilado a partir da dieta é muito baixo, sendo que mais de 99% não é absorvido no sistema digestivo. A absorção cresce significativamente na presença de alimentos ácidos, tal como suco de laranja. A pequena quantidade de alumínio absorvida dentro do corpo é rapidamente excretada pelos rins na urina, exceto em indivíduos com função renal acometida, quando a retenção de alumínio dentro do corpo é responsável pela demência por diálise. As complicações clínicas dessa demência iniciam-se com distúrbios de deglutição e da fala após a administração de solução dialítica contendo alumínio. Após meses de tratamento, essas complicações tornam-se persistentes e associadas a mioclonias, distúrbios de equilíbrio, crises convulsivas e alterações cognitivas que afetam , sobremaneira, a memória. Neste contexto, torna-se imperioso frisar que a “demência por diálise” no início do tratamento de insuficiência renal não possui conexões com a DA, uma vez que, nesta complicação iatrogênica são ausentes os emaranhados neurofibrilares e as placas senis, sem contar que existe a possibilidade de se reverter o quadro clínico da mesma através do uso de medicamentos específicos com capacidade de quelar e remover o alumínio em excesso no organismo.
O alumínio é naturalmente presente na água, e o sulfato de alumínio é largamente utilizado no tratamento de água potável. Entretanto, o consumo de alumínio proveniente da água é muito pequeno em comparação com outras fontes do mesmo. Alguma parcela de alumínio pulverizado oriunda do ar pode penetrar pelos pulmões, não obstante, nesta forma o alumínio seja altamente insolúvel e dificilmente uma fração significativa do mesmo alcance o restante do corpo. Além disso, apenas uma pequena proporção de alumínio ingerida a partir de suas diversas fontes é absorvida pelo corpo, e ainda assim essa exígua fração é usualmente excretada na urina ou depositada inofensivamente nos ossos, este último, agindo tal qual, um captador de alumínio. Para saber mais sobre as fontes diversas de alumínio, leia a tabela abaixo:
Os perigos do alumínio
As pesquisas médicas mostram de forma cada vez mais precisa o papel do alumínio como fator que desencadeia doenças autoimunes ou como fator que acelera a degeneração do sistema nervoso (Alzheimer).

Atualmente encontramos o alumínio:
  • nos cosméticos: em pastas de dentes e desodorantes. A pele é uma via de absorção importante;
  • nos medicamentos: em antiácidos, em cerca de 25 vacinas, em certos produtos de dessensibilização (no caso de alergia);
  • nos utensílios de cozinha: panelas, frigideiras ... que passam alumínio para os alimentos cozidos. Existe também o risco de engolir alumínio ao raspar o fundo desses recipientes;
  • nas embalagens de alimentos: latas de bebidas são perigosas se o produto for ácido (suco de frutas, refrigerantes...); papel de alumínio (não devemos cozinhar peixe no forno, embrulhado nessas folhas, com suco de limão); embalagens “tetrapack” que, às vezes, contêm alumínio em contato com o líquido;
  • nos aditivos alimentares: anticoagulantes, endurecedores, fermentantes, emulsificantes, colorantes, acidulantes... alguns são solúveis e podem atravessar a parede intestinal: E 520, 521,522, 523 e 541;
  • na água potável: produtos utilizados no tratamento da água contêm alumínio e, às vezes, a água da torneira contém o metal.
A absorção excessiva de alumínio causa fibralgias (dores musculares generalizadas) e cansaço crônico. Geralmente isso aparece após os 40 anos, mas um número cada vez maior de jovens está sendo afetado. O excesso de alumínio no organismo também pode provocar: miofascite macrofágica, esclerose lateral amniotrófica, esclerose múltipla, poliartritre reumatóide, o mal de Parkinson, o mal de Alzheimer.

Informação adicional: Union Fédérale des Consommateurs,
Caixa Postal 186, cep 40004 Mont-de-Marsan, França.


Fonte: Silence n° 304, dezembro de 2003.

 Tabela acima retirada do site: www.taps.org.br/Paginas/meiopoquim06.html

Discussão
Conquanto ainda não seja possível inferir conclusão alguma se embasando em estudos epidemiológicos, boa parte dos trabalhos tratando da ingestão de alumínio na água potável tem mostrado uma associação positiva entre DA e alumínio, muito embora, com riscos relativos não muito altos. Em virtude de esses estudos terem sido conduzidos em localidades diferentes do planeta, apresentando, pois, metodologias distintas entre si, faz-nos crer que, seria no mínimo inusitado, aceitar um mesmo fator de confusão como o responsável por um sugestivo viés nos resultados obtidos. E, porquanto não exista uma hipótese plausível capaz de justificar os resultados obtidos nesses estudos, parece razoável endossar a hipótese da correlação positiva entre DA e alumínio. Considerando que existem outros fatores envolvidos na patogênese da DA, dentre os quais, genéticos, ambientais, metabólicos e exposicionais, até o presente momento, não totalmente elucidados, poderíamos considerar o alumínio como sendo um cofator na etiologia da DA. Apesar dessas suposições, não são considerados como contundentes os indícios epidemiológicos encontrados para que se estipulem recomendações de limites máximos de alumínio na água potável.
 Sob a ótica oposta, refutando a ideia constante no parágrafo acima, diz-se que o aumento do nível de alumínio no cérebro estaria associado ao processo natural de envelhecimento e não necessariamente à DA.
Também é oportuno citar a existência de duas barreiras, as quais atuam impedindo a absorção e permanência do alumínio no organismo: a barreira do trato gastrointestinal e a barreira hematoencefálica. Pela primeira, o alumínio é quase totalmente eliminado pelas fezes (99,9%), sendo o restante, aproximadamente exíguos 0,01%, excretado na urina. Pela segunda barreira, substâncias externas, inclusive o alumínio, não conseguem alcançar o cérebro através da corrente sanguínea. Adicionalmente, reconhece-se que os fatores genéticos predispõem significativamente à DA.
No futuro, é possível que modelos apropriados de animais transgênicos, passíveis de desenvolver características patológicas da DA em seus cérebros, permitam aos cientistas determinar se tais alterações são aceleradas pelo nível de alumínio ao qual o ser humano normalmente está exposto.


Bibliografia

Postado por: Pedro Lôbo de Aquino Moura e Silva.