Bioquímica do Alzheimer

“Como é terrível o dom do conhecimento, quando não serve a quem o tem!”

terça-feira, 19 de junho de 2012

Alzheimer e Proteína Tau- Parte 2


Alzheimer e Proteína Tau-Parte 2

Continuemos com a explanação para que se possa compreender a correlação entre Proteína Tau e a Doença de Alzheimer (Você já sabe que a denominamos simplesmente pela sigla “DA”.). Vamos lá então...!

3- Hiperfosforilação e aspectos adicionais da Proteína Tau

No neurônio sadio, a proteína Tau está presente no axônio. Já nas Tauopatias (como pode ser o caso da “DA”), esta proteína se torna insolúvel e é encontrada distribuída pelo corpo celular e pelos dendritos do neurônio, adquirindo a forma de Filamentos Helicoidais Pareados (FHP), principal componente dos emaranhados neurofibrilares. Os FHPs contêm de seis a oito grupamentos fosfato associados por molécula de Tau. Se levarmos em conta que em cérebros sadios cada molécula de proteína Tau apresenta em torno de dois grupamentos fosfato, poderemos inferir certamente que a proteína Tau, identificada em FHPs, encontra-se hiperfosforilada. Como visto anteriormente, a proteína Tau está relacionada com a dinâmica dos microtúbulos e, por conseguinte, qualquer alteração estrutural nesta, a maior das proteínas do citoesqueleto, causaria efeitos deletérios na morfologia e nas funções biológicas conferidas aos neurônios.
Neste ponto é conveniente fazer outras considerações a respeito da proteína Tau. Sabe-se, por exemplo, que ela também é capaz de promover uma interação entre os filamentos de actina e os neurofilamentos (Filamentos intermediários), o qual sugere inter-relação dos microtúbulos com outros elementos do citoesqueleto. Também é averiguado que é por meio dos domínios de projeção aminoterminal da Tau que existe uma interação desta com a membrana plasmática neuronal. Ademais, menciona-se uma exequível interação da Tau com outras organelas, tais como as mitocôndrias.     
A fosforilação in vitro é dirigida aos resíduos de aminoácidos serina e/ou treonina da proteína Tau por mais de dez quinases. Tais quinases podem ser divididas como proteínas quinase dirigidas ou não por prolina. Isso porque no caso de enzimas quinase dirigidas por prolina, ao resíduo de aminoácido serina e treonina fosforilados na Tau de fetos, segue-se imediatamente uma prolina. Para regular o estado de fosforilação da proteína Tau, os tecidos cerebrais contam com a ação conjunta e, por vezes coordenada, de várias quinases e fosfatases. Adicionalmente, o estado de fosforilação da proteína Tau varia ao longo do desenvolvimento. Fetos apresentam-na hiperfosforilada, e a maturação do sistema nervoso central conduz à ativação gradual das fosfatases, responsáveis por mitigar essa característica.
A hiperfosforilação da proteína Tau resulta de uma maior atividade das Tau quinases, ou da subsensibilização de suas fosfatases, ou ainda por ambos os mecanismos citados. Logo abaixo, constam algumas informações adicionais sobre duas classes de enzimas que estão envolvidas no estado de fosforilação da Tau.

                                           http://gsk3-enzyme.blogspot.com.br/

Acima está representada a estrutura tridimensional da enzima GSK-3, a mais importante das Tau quinases.  A GSK-3 (“Glycogen Synthase Kinase-3”) foi descoberta há mais de 20 anos e é uma enzima que atua na fosforilação e inativação da glicogênio sintase. Mais tarde, a clonagem de GSK-3 em tecidos de mamíferos ensejou a descoberta de duas isoformas muito semelhantes de GSK-3, a GSK-3 Alfa e a GSK-3 Beta. Ambas têm grande similaridade no domínio catalítico, muito embora divirjam nas suas porções próximas às extremidades amino e carbóxi terminais. Ainda assim, tanto a GSK-3 Alfa quanto a GSK-3 Beta contém uma serina muito conservada na porção aminoterminal (Ser 9  para GSK-3 Beta e Ser 21 para GSK-3 Alfa), cuja fosforilação está atrelada à regulação da atividade desta enzima. O sítio de ativação encontra-se no resíduo de Tirosina 216, exercendo contato com o substrato a ser fosforilado. Ademais, é sabido que a atividade da GSK-3 é regulada positivamente pela fosforilação da treonina e negativamente pela fosforilação da serina (Liang and Chuang, 2007).  A GSK-3 Beta apresenta-se distribuída no núcleo, no citosol e na mitocôndria e é entendida como a principal Tau quinase, impossibilitando a ligação das proteínas Tau aos microtúbulos, tornando-as dispersas no citoplasma e passíveis de formar emaranhados neurofibrilares no interior dos neurônios (Lovestone et al,. 1996) . A desregulação da GSK-3 mediada pela fosforilação de substratos e por mecanismos de sinalização, não apresentados aqui por se tratar de um estudo inicial, podem implicar a “DA” (Liang and Chuang, 2007).
https://docs.google.com/viewera=v&q=cache:7dDiqrMlCP0J:www.psiquiatriafmusp.org.br/pg/userfiles/Dissertacoes; Fonte original: brahms.chem.uic.edu/.figures/pla2_lig.jpg

Acima está representada a estrutura tridimensional de uma fosfolipase A2 (PLA2) humana. A denominação fosfolipase A2 (PLA2) compreende uma família de enzimas que produzem ácidos graxos livres e lisofosfolipídios a partir da hidrólise da ligação acila do 2ª carbono do arcabouço de glicerol dos fosfolipídios. Na figura, as esferas representam os íons Cálcio (Cálcio com 2 cargas positivas), necessários à atividade catalítica e ao aumento da integridade estrutural dessa enzima. A figura mostra também a orientação do domínio quando da interação com a membrana biológica (indicada pelo plano). Em verde transparente está um análogo da molécula lipídica sendo hidrolisada em seu sítio catalítico. Os resíduos em azul representam mudanças de cargas positivas, importantes para a interação da enzima em interface com a membrana biológica. Na “DA” existem indícios de hipoatividade da PLA2 cerebral, que se correlacionam com um aumento do número de emaranhados neurofibrilares e de placas senis.

4- Enfim, os Emaranhados Neurofibrilares e o Alzheimer
A este ponto, está evidente que o acúmulo intracelular da proteína Tau hiperfosforilada em neurônios ou células gliais corresponde a inclusões imunorreativas à Tau conhecidas como emaranhados neurofibrilares. A hiperfosforilação da Tau compromete a capacidade da Tau desta em estabilizar os microtúbulos. Torna-se afetado, pois, o transporte axonal e o dendrítico, bem como a arquitetura celular, essenciais à manutenção da homeostase neuronal.  O bloqueio do tráfego intracelular de proteínas neurotróficas e de proteínas funcionais advindo da formação desses agregados de proteína Tau hiperfosforiladas, sugere uma obstrução física pelos emaranhados com concomitante desarranjo e despolimerização dos microtúbulos. Ao aparecimento desses agregados, segue-se a apoptose e morte celular. Contudo, já se sabe que a desfosforilação da proteína Tau hiperfosforilada e dos FHPs resulta na recuperação do papel biológico da Tau (Ótima notícia, não?). Um detalhe importante: emaranhados neurofibrilares não estão uniformemente presentes em pacientes com DA e podem existir em outros tipos de demências.
Credita-se o grau de comprometimento cognitivo da DA, por parte de alguns pesquisadores, mais à densidade dos emaranhados neurofibrilares no hipocampo que à deposição de placas de Beta-amilóide. Os Emaranhados neurofibrilares ficam depositados no córtex cerebral e quando do acúmulo desses agregados acima do nível fisiológico, passa a haver uma relação com a gravidade da sintomatologia clínica associada à DA.
Os ENF depositam-se no córtex cerebral e obedecendo a seguinte seqüência: região do uncus, porção mesial do lobo temporal, parte inferior do lobo frontal, giro do cíngulo e outras regiões cerebrais, dentre as quais o tálamo, hipotálamo e o núcleo caudado.



Fonte: Nicotinic Acetylcholine Receptors and Alzheimer’s disease Therapeutics: Review of Current Literature; .Volume 12, Issue 2 on 31 January 2005; Brigham Young University.
Acima está representado o papel de estabilização dos microtúbulos exercido pela proteína Tau, bem como a formação de emaranhados neurofibrilares resultantes da hiperfosforilação de Tau. Logo abaixo, temos um exemplo de dois emaranhados neurofibrilares (Histolgicamente, novelos neurofibrilares) e de um esquema mostrando a localização do hipocampo, região cerebral citada no 2ª parágrafo do item 4.

                                 http://www.sbneurociencia.com.br/diegocastro/artigo1.htm




                                   http://www.sbneurociencia.com.br/diegocastro/artigo1.htm





                                       http://dc256.4shared.com/doc/94XkNCm9/preview.html

Confira a localização do uncus na base do cérebro. O que se pretende é apenas mostrar sua localização.


Finalmente, esperamos que algumas das informações aqui apresentadas tenham lhe incutido a curiosidade nesse assunto, cujos conhecimentos cada vez mais aprimorados fornecerão embasamento a pesquisadores na busca por novidades terapêuticas mais eficientes, aplicadas no tratamento da DA e de outras demências Tau positivas.

Bibliografia:


3)Vanessa de Jesus Rodrigues de Paula; Inibição da fosfolipase A2 e fosforilação da proteína Tau em culturas primárias de neurônios hipocampais; Dissertação apresentada à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Mestre em Ciências. Área de concentração: Psiquiatria; Orientador: Prof. Dr. Orestes Vicente Forlenza.


Autor: Pedro Lôbo de Aquino Moura e Silva

2 comentários:

  1. Boa noite, meu nome é Tamires Alves, sou graduanda de Biomedicina e estou fazendo meu TCC em Alzheimer. O conteúdo do seu blog está maravilhoso, no entanto, é sabido que devemos tirar referências de sites acadêmicos, sem querer desmerecer o seu blog, mas isso tornou-se uma regra (desculpe)e gostaria de saber se o senhor poderia fornecer algumas referências sobre a proteína tau, pois como disse está muito bom. Caso não queira, entenderei. Obrigada.

    Tamires Alves.

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  2. Olá, Boa noite Tamires. Primeiro gostaria de lhe pedir desculpas pelo atraso no envio da resposta. Passamos por um período de 89 de dias de greve na Universidade e estamos retomando nossas atividades nesta segunda semana de agosto. Infelizmente,por estar no primeiro semestre de curso e ainda insipiente, desconheço outras fontes bibliográficas referentes à Proteína Tau além daquelas constantes nas minhas duas postagens anteriores(Proteína Tau- parte 1 e parte 2).Obrigado pela compreensão e pela dica. Pretendo basear meus próximos trabalhos integralmente em referências bibliográficas acadêmicas. Boa sorte no TCC e sucesso!!!

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